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quinta-feira, 1 de setembro de 2011

COMO É VIVER EM PORTO ALEGRE, A CAPITAL DO PLENO EMPREGO

Chamado pelo chefe no meio do serviço, Claiton Silva Vargas desceu contrariado nove lances de escadas do prédio em construção, no centro de Porto Alegre. Desde que assinou a carteira com uma construtora em dezembro, com salário mensal de até R$ 4 mil, o azulejista de 28 anos perdeu as contas do número de vezes que teve de parar o serviço para negar ofertas de trabalho. “Já estava pensando o que falaria desta vez”, disse, aliviado, ao saber que não precisaria inventar desculpas ao encontrar a reportagem do iG.
Como Claiton, o assédio é corriqueiro sobre os trabalhadores da construção civil, um dos setores responsáveis por manter o desemprego da região metropolitana de Porto Alegre entre os menores do País. Segundo a  última pesquisa mensal de emprego do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com dados de julho, a capital gaúcha aparece com um índice de 4,7%, ao lado de Belo Horizonte. O resultado de Porto Alegre é 1,3 ponto percentual inferior à média nacional. O desemprego da metrópole gaúcha e dos 32 municípios dos seus arredores foi o menor nos primeiros seis meses do ano, colocando a cidade próxima da condição do pleno emprego - conceito utilizado por economistas para definir locais onde praticamente grande parte da população economicamente ativa está ocupada. Segundo especialistas, o Brasil teria pleno emprego quando os indicadores de desemprego ficarem na faixa entre 5% e 6%.
Em dezembro, quando Claiton deixou a vida de autônomo e viu sua renda mensal dobrar com o novo emprego, o índice de Porto Alegre havia atingido 3%. Foi a menor taxa de desocupação alcançada entre as seis regiões metropolitanas pesquisadas desde que a série começou a ser feita na década de 1980. “Estamos próximos de um cenário de pleno emprego, no qual as taxas de desemprego são consideradas friccionais (quando o trabalhador fica fora do mercado de trabalho por um curto período)”, diz o economista Flávio Fligenspan, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O desemprego friccional é considerado uma condição natural, uma vez que sempre existirá um nível de desocupação na economia por conta dos trabalhadores que estão trocando de função ou em busca de novas oportunidades. “É inegável que se trata de uma situação muito privilegiada em termos históricos”, diz Fligenspan.
Uma conjunção de fatores conjunturais e estruturais torna a região metropolitana mais meridional do país um dos símbolos da fatura de emprego – alguns deles com características muito singulares. Além de aproveitar o bom momento da economia brasileira, o Rio Grande do Sul tem polos industriais espalhados pelo Estado e não concentrados ao redor da metrópole. Ao contrário de outros Estados, os movimentos migratórios em busca de emprego no Rio Grande do Sul não miram a capital e arredores, mas outras regiões como a serra gaúcha e o Norte. O município de Caxias do Sul, na Serra, é o campeão em atração de novos migrantes, segundo dados do IBGE. Por isso, segundo economistas, a situação do pleno emprego da cidade é tão particular. Sem os migrantes e os desempregados que rondam zonas industriais das demais capitais brasileiras, Porto Alegre e região apresentam maior equilíbrio entre a oferta de trabalho e a demanda por emprego.
Além disso, a capital vem perdendo moradores desde os anos 1990 e enfrenta acentuado processo de desindustrialização. “Essa questão migratória tem um impacto direto na taxa de desemprego da região metropolitana de Porto Alegre, uma das mais desconcetradas do país. Não é apenas a oferta de vagas que cresceu nos últimos anos, mas o fato de que há menos pessoas em busca de trabalho nesta região, o que reduz o níveis de desocupação”, explica o economista Ademir Koucher, supervisor de informações do IBGE no Rio Grande do Sul.
Dados da Fundação de Economia e Estatística (FEE) do Rio Grande do Sul, que faz uma apuração própria de emprego e desemprego, também ilustram esse cenário. Segundo Raul Bastos, economista da FEE, em junho, o nível ocupacional de Porto Alegre cresceu 4,5% enquanto a população economicamente ativa expandiu em 2,6% Ou seja, o ritmo de geração de empregos aumenta de forma mais acelerada do que o número de pessoas que ingressa no mercado de trabalho. Construção civil e serviços são os setores que mais contribuem para o cenário favorável, e já se percebe visível aumento de padrão salarial para os trabalhadores.
"Ganho mais e trabalho menos"
Há 12 anos, quando começou a trabalhar com o pai na construção civil, Claiton Vargas tinha que conciliar o serviço de reformas com o trabalho em um supermercado. Depois, trabalhou de dia como azulejista e, de noite, em um estacionamento. “Eu conseguia me sustentar, mas trabalhava muito", afirma. "Hoje, ganho muito melhor e trabalho bem menos.”
No ano passado, após concluir um serviço em um condomínio de Porto Alegre, foi convidado pelo cliente, dono de uma construtora, a trabalhar com carteira assinada. Não hesitou. “Eu tinha uma clientela, mas ter a garantia de um salário todo mês dá estabilidade”, diz. Com um salário de, em média, R$ 4 mil, quase o dobro do que ganhava como autônomo, Vargas comprou um Gol 2007 em prestações de R$ 500, uma moto e está terminando de reformar casa, em Viamão, na região metropolitana da capital gaúcha. “Agora, quando esquentar, vou começar a vir de moto para o trabalho. Senão, uso o caro. Não ando mais de ônibus porque é muito estressante”, afirma. Vargas não pensa em largar o canteiro de obras. “De comida e casa todo mundo precisa. Então, não corro o risco de ficar sem trabalho”, conclui o azulejista, que está mais acostumado a recusar ofertas de emprego do que correr atrás delas. “As pessoas também têm uma ideia errada da construção civil. Hoje, ninguém mais carrega peso. Eu não misturo nem a cola, só corto e coloco o azulejo”, conta.
Setores como a construção civil viram a demanda crescer na mesma velocidade com que os custos da mão de obra, escassa, se tornou mais cara. “O piso da categoria subiu quase 10% e o preço da produção por metro quadrado também. Se não pago bem, perco pessoal e dinheiro, porque a obra para”, diz o engenheiro Giovani Perdomini, sócio da construtora que emprega Claiton. Ademir Koucher, do IBGE, compara essas mudanças às sofridas pela Europa e Estados Unidos, países em que os setores de serviços e construção são conhecidos por remunerações atraentes. “Se o setor enfrenta déficit de pessoal, terá de pagar melhor para compensar”, diz o economista. “A maioria conhece alguém que já morou fora e trabalhou em construções por causa dos bons salários. Situação semelhante está começando a ocorrer no país”, diz Koucher. Os baixos índices de desemprego em Porto Alegre são as feições mais visíveis desse fenômeno no Brasil.

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